Tuesday, December 20, 2016

for debate - a nova democracia sobre a questao de Fidel Castro



A morte de Fidel e o destino do revisionismo cubano

Rui Lupa
Jaílson de Souza

“Sentimos o afã de redenção e solidariedade do povo cubano, voltado para seus irmãos ainda sob o jugo do mesmo inimigo: o imperialismo norte-americano. É a primeira vez que se ergue na Assembleia das Nações Unidas a voz de um povo latino-americano verdadeiramente livre e independente, proclamando que os princípios contidos na Primeira Declaração de Havana são os objetivos da Revolução, a qual tem uma importância sem precedentes para a história dos países da América Latina.”
Pedro Pomar, dirigente do Partido Comunista do Brasil

“É lamentável que uma revolução tão importante como a revolução cubana tenha sido truncada e mesmo traída. (…) Como é diferente o Fidel de 1973 do de 1953! Entregou-se completamente aos social-imperialistas soviéticos. Na realidade, enrolou a bandeira da revolução. Mas, nem por isso o movimento revolucionário deixa de avançar na América Latina.”
Maurício Grabois, dirigente do Partido Comunista do Brasil e comandante na Guerrilha do Araguaia.
Com a morte de Castro, toda a reação mundial e particularmente a guzanada enquistada em Miami se agitaram frenética e histericamente expelindo todo seu rancor e recalques de capachos e lacaios do imperialismo ianque e sua baba hidrofóbica de ódio à memória do que foi a Revolução Cubana. Brindaram celebraram a morte de Fidel agitando bandeiras de uma Cuba serviçal do USA, no último 26 de novembro.
Esses arrivistas festejam a morte de Castro como se enterrassem com ele o comunismo. Essa gente odeia as massas, sente repulsa a qualquer coisa minimamente popular e democrática, como as conquistas da Revolução Cubana alcançadas antes de que sua alta direção a colocasse de joelhos frente ao social-imperialismo soviético sobre o bastão de Kruschov, Brejnev e seus sucessores, todos traidores do socialismo.
A primeira questão importante é compreendermos o ódio com que o monopólio da imprensa e os diversos grupelhos anticomunistas viscerais de direita e da reação tratam Fidel Castro e a Revolução Cubana. Embora seja um processo de avanço com significativos recuos e estagnação por ter sido uma revolução democrática que não avançou ao socialismo e, portanto, resultou inconclusa e que culminou com a sujeição de Cuba à URSS social-imperialista, fato é que Fidel Castro e a luta armada que planteou o programa democrático das reformas agrária, educacional, habitacional e no tratamento da saúde popular, etc. animaram todo o movimento popular, particularmente na escravizada América Latina, inspirando revolucionários e lutas anti-imperialistas por todo o mundo.
Um pequeno país, colado às fronteiras ianques, declarava-se independente e ameaçava inspirar a rebeldia na mais importante base do imperialismo ianque: a América Latina.

Rompem as correntes: triunfa a Revolução Cubana

Em 1960, Fidel lia para uma multidão entusiasmada o programa democrático da Revolução, no que ficou conhecido como Primeira Declaração de Havana.
“O direito dos camponeses à terra; o direito do trabalhador ao fruto do seu trabalho; o direito das crianças à educação; o direito dos doentes à assistência médica e hospitalar; o direito dos jovens ao trabalho; o direito dos estudantes à educação gratuita, experimental e científica; o direito dos negros e dos índios à ‘dignidade plena do homem’; o direito da mulher à igualdade civil, social e política; o direito dos idosos a uma velhice segura; o direito dos intelectuais, artistas e cientistas a lutar, com suas obras, por um mundo melhor; o direito dos Estados a nacionalização dos monopólios imperialistas, resgatando assim as riquezas e recursos nacionais; o direito dos países ao comércio livre com todos os povos do mundo; o direito das nações pela sua plena soberania; o direito dos povos em converter suas fortalezas militares em escolas, e armar seus trabalhadores, seus camponeses, seus estudantes, a seus intelectuais, o negro, o índio, a mulher, o jovem, o idoso, todos os oprimidos e explorados, para que defendam, por si mesmos, seus direitos e seus destinos.”
A Revolução Cubana, sendo num país semicolonial-semifeudal, nasceu erguendo bandeiras democráticas, expressando a insatisfação das massas populares do povo cubano que viviam em total subjugação nacional e brutal tirania, com sua economia reduzida à monocultura e ao turismo de bordéis e cassinos.
Com o golpe do ditador Fulgência Batista em 1952, diversos grupos se insurgem, e entre eles um grupo liderado por Fidel e Raul Castro tenta de armas nas mãos tomar um quartel militar, o Quartel de Moncada (1953). Lá são presos e, quando soltos, se exilam no México, de onde organizam nova tentativa de derrubar Batista, desembarcando com o iate Granma com 82 combatentes e desencadeando a luta armada pelo poder.
Entre eles estava o argentino Ernesto “Che” Guevara, que demonstrou rapidamente ser de todos aqueles democratas revolucionários o mais avançado, representando a ala esquerda da revolução democrática que se desenvolvia.

O caráter de classe

“É simplesmente ridículo negar a necessidade do Partido na realização da luta armada, como faz Fidel Castro (…). A negação do Partido é, no fundo, uma forma de se opor à hegemonia do proletariado na revolução em benefício da pequena-burguesia.”
Comitê Central do Partido Comunista do Brasil, janeiro de 1969, em “Guerra Popular, o caminho da luta armada no Brasil”
Deste ousado processo revolucionário que resultou na vitória em 1º de janeiro de 1959, romantizado com ares de aventura juvenil, se desenvolveu uma série de conclusões que confundiram os setores menos esclarecidos do movimento popular e revolucionário ao longo de muitos anos.
O ponto que logo foi bastante explorado pelos que procuram atalhos fáceis foi o de que seria possível que um punhado de homens, sem a direção de um autêntico Partido Comunista, poderia iniciar uma guerrilha e, com a própria dinâmica dos combates, mobilizar as massas populares para posteriormente conquistarem o poder. Assim, Fidel Castro incentivou o revisionismo armado e todo tipo de oportunismo de “esquerda”, levando à derrota várias lutas revolucionárias em toda a América Latina, aqui mesmo no Brasil, sendo a mais recente as Farc na Colômbia.
Che Guevara mesmo tentou aplicar essa fórmula na Bolívia e pagou com a própria vida os equívocos de teorias que preconizam subestimar o papel de direção do Partido Comunista como encarnação da ideologia científica do proletariado ou de substituí-lo por “frentes de esquerda” ou outros arranjos pequeno-burgueses.
Outro tortuoso legado do grupo de Castro foi a reivindicação de algumas reformas sociais de cunho democrático, como se tratando de transformações socialistas.
As primeiras ações do governo revolucionário são autenticamente democráticas e anti-imperialistas, como a democratização do acesso à terra, a nacionalização das empresas estrangeiras e um investimento em saúde, educação e moradia populares. É desse processo inicial de caráter democrático-burguês da Revolução Cubana que nasceu as mais importantes conquistas para o povo cubano.
Lenin, ao analisar a fase imperialista do capitalismo, a qual vivemos, afirmou que a partir de então está terminado o período das revoluções democráticas dirigidas pela burguesia e pela pequena-burguesia, e se iniciara a era das Revoluções Proletárias. Com isso Lenin afirmou que em um mundo repartido entre potências imperialistas, nenhum país semicolonial conseguiria desenvolver-se de forma autônoma e independente sem que houvesse uma revolução democrático-burguesa ligada à onda revolucionária proletária, iniciada com a ousada Comuna de Paris, em 1871, mas principalmente triunfante com a Revolução Bolchevique de 1917 na Rússia.
Assim, a luta anti-imperialista e anticolonial não pode vencer desvinculada da luta pela revolução proletária mundial; necessita da direção do Partido Comunista para elevar do programa democrático e anti-imperialista à revolução ininterrupta ao socialismo, sob risco dessas revoluções desabarem e seguir o bastão de mando de uma ou outra potência imperialista.
A Revolução Chinesa, vitoriosa 10 anos antes da Revolução Cubana, demonstrava a validade das teses de Lenin através da sua aplicação concreta pelo Presidente Mao Tsetung. No país mais populoso do mundo, em uma encarniçada e prolongada luta dirigida pelo Partido Comunista, levava a cabo as transformações democráticas (principalmente a Revolução Agrária e a independência nacional) passando ininterruptamente às transformações socialistas, que significavam a industrialização acelerada do país e a coletivização da agricultura baseadas nos próprios esforços e na mobilização das massas.
Sem que se avançasse às transformações socialistas que pudessem consolidar o poder político, as próprias conquistas da Revolução, como a independência nacional e a Revolução Agrária, estariam ameaçadas.

Um problema recorrente: a troca de amo

Logo após a tentativa de invasão de Cuba por tropas financiadas pelo USA, em 1961, Fidel faz uma opção política e ideológica. Como forma de manter-se fora da área de influência ianque, escolhe a sujeição à URSS social-imperialista, já na época em pleno processo de restauração capitalista.
Fator decisivo para esta decisão foi a ausência da direção proletária revolucionária para elevar a Revolução Cubana a um novo patamar, passando-a à revolução socialista. Aplica-se assim a política de “troca de amos”, ou seja, sujeição de Cuba a um novo patrão, ao domínio de outra potência imperialista, o social-imperialismo soviético.
Nesse processo é formado um arremedo de partido (denominado de “comunista”), para reproduzir as formas políticas, já sob direção revisionista da URSS, que nada tem mais a ver com socialismo.
Interrompe-se qualquer processo de desenvolvimento nacional, industrialização e coletivização da agricultura, inclusive retroagindo importantes avanços dos primeiros anos da Revolução, para aplicar a política social-imperialista formulada por Brejnev de “divisão internacional do trabalho”. Cuba mantém sua economia fornecedora de matéria-prima e monocultura à URSS social-imperialista, retornando à situação de colônia, na sua forma semicolonial, de antes da revolução.
É importante entender que isso é o resultado lógico de uma revolução democrática quando não dirigida pelo proletariado, através de seu Partido Comunista. No caso particular de Cuba, ocorreu que, ao se sujeitar ao social-imperialismo soviético, passou à direção da revolução o revisionismo, cuja cabeça do processo foi capitaneado por Fidel Castro.
Já para a camarilha revisionista que assaltou o poder na URSS, Cuba serviu como uma importante base avançada em sua pugna com o imperialismo ianque, e um contraponto no movimento comunista internacional ao protagonismo dos comunistas chineses, já que o PCUS não motivava o ímpeto revolucionário dos povos e, por outro lado, o “guerrilheirismo errante” com fraseologia castrista pôde ajudar a expandir a influência social-imperialista soviética. Com a opção de Fidel Castro pelo revisionismo soviético, o povo cubano perdeu a sua soberania e paralisaram-se os avanços sociais.

Negação da luta armada e cretinismo parlamentar

“Cuba tem alta responsabilidade na América porque foi uma esperança; mas temos que recordar muito bem o que se passou nos anos 70: Fidel Castro afirmou que a estratégia da luta armada havia fracassado, buscando abandoná-la, deixar o que havia incentivado e apoiado.”
Presidente Gonzalo, chefatura do PCP e da Revolução Peruana
Logo após incentivar o revisionismo armado, causando desgastes e capitulações ante as derrotas militares dos grupos guerrilheiros, o próprio Castro passa a renegá-la, tachando a luta armada de “relativa e pouco optativa”. Fazendo coro com a Perestroika, afirmou ser o perigo principal a “guerra nuclear”, que a bomba atômica impedia a vitória da revolução e sustentou esta tese contrarrevolucionária de que não há diferença entre os imperialistas e povos oprimidos, pois “estamos todos no mesmo barco”. Aponta como saída a via do cretinismo parlamentar e da legalidade subordinada aos velhos Estados, como fizera recorrentemente com vários processos na América Central e com as Farc desde as décadas de 1980 e 1990, até o último dia de sua vida.

Bancarrota e lições a extrair

Com a bancarrota do revisionismo e o fim da URSS social-imperialista, na década de 1990, o povo cubano teve que enfrentar, sem o suborno dos revisionistas soviéticos dados aos dirigentes cubanos, o criminoso bloqueio do imperialismo ianque, contando apenas com tabaco e açúcar e dificuldades colossais. Dificuldades que não foram superadas graças à decisão da direção cubana de servir de satélite aos revisionistas soviéticos.
A saída de Fidel para a crise pós-URSS foi mais uma vez a busca por outras potências imperialistas, chegando aos dias de hoje com Raul tendo que colocar as conquistas da revolução de 1959, já bastante debilitadas pelo revisionismo de décadas, à mercê do retorno à subjugação nacional ao imperialismo ianque.
Embora Fidel declarasse após a visita de Obama ao país que Cuba “não precisava de presentes”, numa encenação de manter sua posição anti-ianque, não pôde encobrir a triste e deprimente cena de Raul erguendo o braço do representante imperialista como que dizendo “certo, vocês venceram”.
Assim, Fidel, ao contrário de representar os “problemas do socialismo”, como alardeiam toda a sorte de anticomunistas ou a morte de um comunista, representa a falta que faz o Partido Comunista, hoje marxista-leninista-maoísta, em qualquer processo revolucionário para garantir sua própria vitória; representa o risco do revisionismo na cabeça da revolução democrática e as consequências de não se avançar desta para o socialismo; significa o fim de um ciclo da história de Cuba com o qual o revisionismo castrista, representado pelo velho regime que ele chefiou até sua morte, inevitavelmente terá seu colapso.

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