“As mulheres sustentam sobre seus ombros a metade do céu, e devem conquistá-la.”
Presidente Mao Tsetung
O episódio que recentemente veio a público, rodeado do sensacionalismo
costumeiro, envolvendo a acusação da modelo brasileira Najila Trindade,
de ter sido estuprada pelo milionário e famoso jogador de futebol,
também brasileiro, Neymar, serviu uma vez mais, para revelar o
arraigamento da mentalidade atrasada, patriarcal e machista na sociedade
brasileira. Mais que isto, pôs a nu de como o que pesa é a natureza de
classe no tratamento dos fatos, quando estão envolvidos ricos e
poderosos. O episódio também faz caco das poses e arroubos com que a
Globo, que invade os lares brasileiros com suas programações com cenas
apelativas de exposição da intimidade pessoal, com vistas a maior
audiência, travestidas de defesa da “liberdade” sexual e de
comportamento, particularmente se utilizando da exposição do corpo e
sexualidade da mulher.
O
recente episódio que veio a público envolvendo a acusação de estupro da
modelo Najila Trindade por Neymar (rodeado do sensacionalismo
costumeiro) serve para revelar o arraigamento da mentalidade atrasada,
patriarcal e machista da sociedade brasileira. Põe a nu, também, os dois
pesos e duas medidas da opinião publicada dos monopólios de imprensa,
uma, quando os “suspeitos” são pretos e pobres – condenados até que se
prove o contrário, outra, quando os acusados são ricos e poderosos:
meninos inocentes, vítimas das suas vítimas.
O fato de
Bolsonaro ter dado a este episódio quase o status de problema de Estado é
revelador de como este caso explicita toda a misoginia estrutural de
nossa velha sociedade semicolonial e semifeudal. A verdade é que todos
os demônios e preconceitos mais rasteiros sobre o papel da mulher vieram
à tona a partir deste caso. Lamentável é que muitos setores ditos
progressistas, e mesmo ativos representantes do “feminismo”, tenham
capitulado deste enfrentamento sério e necessário quando ele se
apresenta às claras.
Najila
tem sido execrada e não espantará se, de vítima, daqui a pouco seja ela
a sentar no banco dos réus. Os monopólios de imprensa já fizeram sua
parte, encarregando-se de inverter os papeis de acusador e acusado. Sua
cobertura, mesmo aquelas mais “sutis”, apresenta a mulher como uma
“aproveitadora” e Neymar, coitadinho, como um menino ingênuo. Afinal,
não é natural que um playboy milionário possa usar as pessoas a seu bel
prazer? Que mal há em que um ricaço, que ostenta mansões, carrões,
aviões, possa igualmente comprar, usar e ostentar as mulheres como bem
entenda, consintam elas ou não?
É
esta visão de mundo grosseira, tacanha, prostituída, que está por trás
de toda a enternecida defesa do “menino Neymar” que tem prevalecido no
senso comum.
Ele afirma que
não a agrediu e não a estuprou. Mas o fato inconteste é que as marcas da
agressão estão registradas em fotografias que foram publicadas por ele
mesmo, em mais uma demonstração de desrespeito, ao expor o corpo de
Najila nas redes sociais. Em sua defesa e não podendo negar os fatos,
Neymar chega ao absurdo de afirmar que a agrediu porque ela pediu. É,
portanto, um réu confesso, certo da sua impunidade uma vez que as “leis”
- inclusive as que supostamente protegem as mulheres – não chegam até
os condomínios fechados da burguesia.
Na
verdade, o fundo de todo esse discurso machista e misógino, reproduzido
diuturnamente pelos monopólios de comunicação, pelas igrejas e outras
estruturas ideológicas do velho Estado reacionário é expressão do
pensamento reacionário e decadente das classes dominantes em nosso país,
a grande burguesia, o latifúndio e o imperialismo (principalmente
ianque), revelando a pútrida ideologia dessa velha sociedade patriarcal,
semifeudal e semicolonial. Para essa sociedade o valor da mulher é
medido por padrões de beleza e sensualidade que correspondam à sua
utilidade enquanto mercadoria e não pela condição social da imensa
maioria delas, ou seja, trabalhadoras que são, seres humanos completos
com capacidades produtiva e científica. Toda essa cultura reacionária da
opressão feminina serve para sustentar a base dessa sociedade de
exploração. Historicamente os sistemas de exploração e opressão
relegaram as mulheres do povo às funções mais secundárias na sociedade, a
de meras reprodutoras exaltando-as como rainhas do lar para que se
resignassem à condição da escravidão doméstica. Tudo para reduzir ao
máximo sua prática social e assim aplastar sua participação na luta de
classe, separando do proletariado revolucionário a metade do seu
exército.
No capitalismo
cabe às mulheres do povo a extenuante tarefa do trabalho doméstico,
trabalho invisível e embrutecedor que garantem a reprodução da força de
trabalho para as classes exploradoras na forma de trabalho gratuito. Com
isto os salários podem ser mantidos em níveis baixíssimos, o patrão não
precisa desembolsar nada para garantir que seu empregado se apresente
no trabalho diariamente, alimentado, vestido e cuidado todos os dias.
Ele explora a classe de duas formas: na fábrica, com pouca paga e no
lar, com esse trabalho não pago da mulher. Quando são inseridas na
produção social é para aumentar a exploração da classe impondo a elas
uma dupla jornada.
Em
propagandas oficiais, o próprio monopólio de imprensa, em campanhas
contra a violência sobre a mulher, afirma que, em casos de estupro a
palavra da vítima basta para abrir processo. Porque então este mesmo
monopólio, com a Rede Globo à cabeça, faz sensacionalismo criando um
ambiente de ataque e condenação à vítima? Revela o fundo hipócrita de
seu discurso de “arautos dos direitos das mulheres e das liberdades
sexuais”.
Esses
mesmos órgãos do monopólio de comunicação que se apresentam como
vanguarda na “luta das mulheres pela liberalização sexual” são os
maiores promotores da utilização do corpo feminino como objeto sexual e
apologistas da prostituição. São, no máximo, a vanguarda do atraso,
defendendo com novas roupagens a velha tara burguesa de converter a
mulher em mero objeto de consumo, tanto no lar como na rua. As novelas
cumprem um papel ideológico de fortalecimento do machismo, naturalizando
a pornografia e a prostituição, alimentando esse mercado extremamente
lucrativo, para que as meninas, desde a mais tenra idade, acreditem que
seu valor está na exposição de sua sexualidade, estimulando um
comportamento sexual desregrado e degenerado, como se isso fosse a
“libertação” da mulher. Chegam a defender a prostituição como uma
“profissão digna como qualquer outra”, quando é, na verdade, a maior
expressão do rebaixamento da condição humana, tanto de quem se prostitui
quanto de quem se utiliza da prostituição. Em seus programas de
“entretenimento” glamorizam a prostituição como se as mulheres que vivem
nesta condição não sofressem os piores tipos de humilhações e
violências. Promovem e fortalecem diuturnamente a velha cultura de
subjugação feminina, enquanto demagogicamente fazem campanhas “contra a
violência sobre a mulher”. Quando fazem denúncias dos inúmeros casos
diários de feminicídio, naturalizam o problema como se fosse uma questão
de desvio de conduta moral ou de personalidade individual dos
agressores e escondem que a base de todo esse repugnante cenário é a
manutenção dessa sociedade de exploração e opressão. Contudo, o final
feliz das novelas costuma ser sempre igual: para a mulher “regenerada”, o
altar e o casamento, a redenção nos braços do príncipe encantado.
O caso Neymar é
mais uma expressão de como a mulher é tratada nessa sociedade, vítima
de todo o tipo de violência, exploração e opressão. São mais de 1300
estupros praticados por dia no nosso país segundo dados oficiais, e
esses números elevadíssimos seguramente ainda são subestimados. Na
verdade, além desses horrores com que convivemos diariamente, a maior
parte dos estupros acontecem sobre os brancos lençóis dos ditos
bem-casados, abençoados pelas igrejas que lhes impõem seus caducos
dogmas e segundo os valores morais hipócritas, certificados pelos
cartórios dessa velha sociedade. Os crimes de estupro são muito difíceis
de ser comprovados tanto por geralmente acontecem sem testemunhas,
quanto por ser acobertado pela cultura machista que justifica as maiores
barbaridades no comportamento masculino. Influenciados pela ideologia
machista, os homens que praticam o estupro pensam que têm o direito de
tomar a mulher pela força, quando ela não quer praticar sexo ou não quer
fazer da forma como o homem quer impor. É direito da mulher querer
interromper uma relação sexual se assim é o seu desejo. Na maioria das
vezes as mulheres se sujeitam a fazer o que não desejam, o que as faz
sentir sujas, por uma série de constrangimentos que lhes é imposta, como
o que é normal e aceitável nessa sociedade. O fetiche das “fantasias
sexuais” e da exacerbada erotização de tudo promovido pela indústria
pornográfica, que cada vez mais inunda os meios de comunicação,
publicações e entretenimentos, estimula todo tipo de degeneração humana e
serve à manutenção da mulher como puro objeto, desprovida de desejo,
sentimento e dignidade próprios e apontada como ser inferior. Difunde-se
o mito de que o estuprador é o homem pobre e negro, saído de um matagal
ermo, quando a maior parte dos casos de estupro e assédio ocorrem
dentro de casa ou no ambiente de trabalho. Sem falar das incursões
policiais nas favelas, que deixam um rastro não apenas de jovens
assassinados, mas também, muito comumente, de mulheres violadas. Sobre
isso, o monopólio de imprensa e os arautos da “moralidade cristã”
guardam um silêncio cúmplice e criminoso.
Todo o
feminismo burguês e pequeno-burguês, supostamente radical, convergem
para esse mesmo tipo de pensamento e apontam como suposta “libertação
sexual” da mulher o direito dela expor seu corpo e usar sua sexualidade
como “empoderamento” não importando forma, a qualquer preço e a qualquer
custo. Como se a emancipação da mulher fosse a “conquista” do direito
de fazer todas baixezas tidas por “coisas de homem”. Ou seja, estimulam
que homens e mulheres desenvolvam relacionamentos efêmeros, baseados
exclusivamente em sexo, desligados de outros aspectos da vida social,
particularmente da luta de classes. Isto não é nem de longe o que
mulheres e homens podem construir juntos elevando sua condição humana.
Para contrapor essa velha cultura de subjugação da mulher é necessário
destruir as bases sobre as quais ela se sustenta, a sociedade de
exploração e opressão de classe e a propriedade privada. Ao mesmo tempo
em que destruímos esta velha sociedade do individualismo e egoísmo,
construímos uma nova, coletivista, com novas bases sociais, em que a
mulher é considerada um ser humano completo, inserida na prática social
ombro a ombro com o homem. Junto com essa nova sociedade se erguerá uma
Nova Cultura em que as relações entre homens e mulheres serão de tipo
mais elevada e profunda, baseadas em companheirismo e respeito.
Para não julgar
o caso Neymar pelas aparências, é necessário refletir sobre todas essas
questões, baseando-nos numa análise de classes da sociedade. Neymar é
considerado um ídolo de uma geração inteira de jovens. Quão triste e
miserável é uma ordem em que os exemplos das futuras gerações não são
legítimos membros do povo, seus trabalhadores e pensadores verdadeiros,
mas projetos de jogador como este tal. De fato, neste sentido, Neymar
não passa de um moleque: não completou sua formação como atleta, menos
ainda como ser humano. É, ele também, um lúmpen dos tantos que uma
sociedade em decomposição como a nossa cria diariamente. O que não
espanta, se pensarmos que é também um lúmpen miliciano que se senta hoje
na cadeira de presidente desta republiqueta.
Seu
comportamento machista reforça nesses mesmos jovens a concepção de que
os homens devem usar as mulheres como objeto, de forma descartável, como
uma propriedade. O discurso de que “se ela apanha, é porque fez por
merecer” ou “porque gosta”, é parte dessa mesma concepção. É a mesma
lógica que leva à prática do feminicídio, realidade cada vez mais grave
em nosso país e em todo o mundo, hoje, mais do que nunca em crescente
desordem, afundado na crise geral de decomposição do capital, o
imperialismo.
O Movimento
Feminino Popular repudia toda essa velha ordem hipócrita e reafirma a
luta pela construção de uma sociedade que ponha fim a toda repugnante
ordem de opressão feminina. A condição para transformar essa realidade
que subjuga a mulher do povo diariamente só pode se dar através da
destruição da base material que a sustenta. Nos países
semicoloniais/semifeudais como o Brasil, bem como a imensa maioria dos
países no mundo, esse caminho passa pelas Revoluções de Nova Democracia
ininterruptas ao Socialismo.
A origem e a
causa da opressão feminina é a propriedade privada, bem como o
patriarcado e a divisão da sociedade em classes antagônicas dela
derivadas, que serve e reproduz a exploração e opressão do homem pelo
homem. Somente com a erradicação completa desses fatores e sua
substituição por novas relações de produção, baseadas na propriedade
social dos meios de produção e de distribuição da riqueza, pode conduzir
a emancipação das mulheres ao emancipar politicamente a classe operária
e demais classes trabalhadoras. Ou seja, a revolução social do
proletariado – composta de homens e mulheres – para o estabelecimento do
socialismo em transição para a sociedade sem classes, o comunismo.
MFP – Movimento Feminino Popular
Junho – 2019
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