Sunday, June 2, 2013

Brasil - Área Paulo Freire 3: um retrato da verdadeira situação agrária brasileira.


Em março de 2013, a Folha de São Paulo publicou o artigo “A nova rota da reforma agrária no Brasil” assinado pelo ministro do Desenvolvimento Agrário Pepe Vargas e o presidente do Incra Carlos Guedes. Ao ler o subtítulo “A desigualdade caiu mais no campo do que na totalidade do país” já nos perguntamos: de qual país eles estão falando?
Uma série de dados estatísticos vem em seguida: “O Brasil promoveu a maior política de acesso à terra do mundo em pleno século 21. Os 87 milhões de hectares destinados à reforma agrária equivalem em dimensão a 27% das terras agrícolas do país. Eles já superam, em número e área, o total dos imóveis rurais brasileiros com extensão superior a 5.000 hectares. Tal atuação, na sua maioria realizada durante os governos Lula e Dilma, contribuiu significativamente para a redução da desigualdade de renda no meio rural brasileiro. No período de 2003 a 2009, a queda da desigualdade foi de 8,3% no campo contra 6,5% na totalidade do país.”
Em março de 2013, a Folha de São Paulo publicou o artigo “A nova rota da reforma agrária no Brasil” assinado pelo ministro do Desenvolvimento Agrário Pepe Vargas e o presidente do Incra Carlos Guedes. Ao ler o subtítulo “A desigualdade caiu mais no campo do que na totalidade do país” já nos perguntamos: de qual país eles estão falando?
Uma série de dados estatísticos vem em seguida: “O Brasil promoveu a maior política de acesso à terra do mundo em pleno século 21. Os 87 milhões de hectares destinados à reforma agrária equivalem em dimensão a 27% das terras agrícolas do país. Eles já superam, em número e área, o total dos imóveis rurais brasileiros com extensão superior a 5.000 hectares. Tal atuação, na sua maioria realizada durante os governos Lula e Dilma, contribuiu significativamente para a redução da desigualdade de renda no meio rural brasileiro. No período de 2003 a 2009, a queda da desigualdade foi de 8,3% no campo contra 6,5% na totalidade do país.”
Porém, a realidade que vivemos é bem diferente.
Queremos aqui fazer um resumo da história da área Paulo Freire 3, em Seringueiras, que é um exemplo da verdadeira situação agrária no Brasil: Incra, justiça, polícias e pistoleiros obedecem cegamente as ordens de latifundiários e reprimem violentamente camponeses pobres que vivem e trabalham na área onde antes só tinha gado para exportação. Os alimentos produzidos pelos camponeses ajuda a abastecer a cidade de Seringueiras, conquistando o apoio de trabalhadores, comerciantes e democratas.
No dia 13 de abril, esta área foi palco de um dos despejos mais absurdos da história de Rondônia, a mando do juiz federal de Ji Paraná, Flávio da Silva Andrade. Mesmo sem resistir, as 84 famílias foram atacadas com spray de pimenta, bombas de efeito moral, bombas de gás lacrimogêneo e balas de borracha, disparados por 200 policiais civis, militares e federais, do GOE e do Exército. Alguns camponeses foram presos e mesmo estando deitados no chão, rendidos e algemados, policiais ajoelharam no pescoço deles e jogaram spray de pimenta em seus rostos. Filhos e esposas presenciaram tamanha violência. Policiais atiraram em cães dos camponeses sem motivo algum. 5 pessoas, entre elas 3 crianças, foram hospitalizadas. Crianças e até adultos ficaram várias noites acordando sobressaltados, traumatizados com tanto terror.
A polícia, o latifundiário Timiro e seus pistoleiros ficaram na área. Policiais ainda ameaçaram os camponeses: “Cuidado com o fazendeiro Timiro e seus comparsas que estão lá dentro da fazenda. Se vocês virem eles, corram, pois nós não responsabilizamos pelas vidas de vocês”. As famílias, que saíram apenas com a roupa do corpo, não puderam se aproximar da área nem retirar seus pertences, sequer roupas para as crianças continuarem estudando. Quando os camponeses puderam entrar, constataram que botijas de gás, bombas pulverizadoras, galões de venenos, foices, facões e tambores de leite tinham sido roubados. Vale também destacar que a liminar de reintegração permitia apenas a família “de Peder” e os camponeses entrarem na fazenda.
Delegado Caio Porto Ferreira comandou este que foi um dos despejos mais absurdos da história de RondôniaDelegado Caio Porto Ferreira comandou este que foi um dos despejos mais absurdos da história de RondôniaO delegado da polícia federal Caio Porto Ferreira que comandou o despejo criminoso, sem dar nenhuma explicação proibiu os jornalistas do Jornal Rondovale de acompanharem a operação. O tenente Lúcio ameaçou um jornalista do Jornal: “Eu juro que vou te prender, nem que seja a ultima coisa que eu faço, suma daí, suma daí!”. A polícia queria garantir que fosse divulgada sua versão mentirosa de que tudo ocorreu sem maiores problemas, como disse o delegado: “Após a conversação, a negociação foi encerrada e passamos a progredir taticamente”. O povo brasileiro conhece bem a tática das polícias.
O despejo não obedeceu o protocolo de avisar com 48 horas de antecedência o ministério público e outros órgãos públicos, assim como a OAB e movimentos sociais, medida preventiva de excessos e violências. Outro absurdo: um dia antes do despejo, a justiça federal decidiu que dois dos seis lotes que compõem a fazenda, um total de 800 hectares, foram liberados para o Incra realizar assentamento das famílias.
Política agrária do governo Lula/Dilma/PT conseguiu a façanha de ser ainda pior que a do governo FHC
Abaixo vamos relatar outros fatos importantes da atuação do latifúndio, seus bandos armados e seus agentes no velho Estado na área Paulo Freire 3:
Pistoleiros contratados pelos latifundiáriosPistoleiros contratados pelos latifundiários1. Localizada na fazenda Riacho Doce, na linha 2 de maio, distante 4 Km da cidade, os camponeses iniciaram acampamento em 2006. Quem se diz dono da fazenda de 2.500 hectares é Tião de Peder, conhecido como Tião Terboi. Ela foi escolhida pelos camponeses a pedido de famílias que foram oprimidas pelo Tião Terboi. Ele comprou de graça uma terra de seringueiros e expulsou famílias que viviam lá, soltando gado em suas lavouras e ameaçando-os de morte, como relatou uma senhora: “Você não conhece fazendeiro. Eu era menininha quando os peões do Tião Terboi disseram pro meu pai que ele tinha que abandonar a terra senão morreria. Meu pai chegou chorando pra nós e tivemos que sair...”
2. Certa vez, um funcionário do Incra perguntou aos camponeses da área Paulo Freire 3 por que não invadiam também as fazendas vizinhas, pois nenhuma tem documento, confirmando os boatos que sempre correram na região. A fazenda Riacho Doce são terras da União, o título foi ilegalmente emitido pelo Incra para o filho de Tião Terboi, na época com 12 anos! Hoje, quem está a frente das ameaças e perseguições aos camponeses é Artemiro Craus, conhecido como Timiro. Sua participação ativa indica que ele não é um simples arrendatário de pasto, ele deve ter comprado as terras de Tião, mas não aparece nos processos. Esta situação nebulosa é muito comum em várias áreas de conflito agrário. Timiro possui muito gado e outras terras na região, inclusive uma de mais de 5.000 hectares. Existem boatos de que ele também tomou o lote de um agricultor vizinho a uma de suas propriedades.
3. Em dezembro de 2012, quando os camponeses retomaram as terras, capturaram um pistoleiro armado e filmaram um depoimento dele onde assume que trabalhava para Timiro com a ordem de matar qualquer camponês que tentasse retomar a fazenda. O vídeo provava o que as famílias sempre denunciaram, mas nada foi feito.
4. Recentemente, em entrevista na TV, a Ouvidora Regional dos latifundiários, Márcia Nascimento, disse cinicamente que havia conflitos entre grupos de camponeses da área. Ela só não falou que esta é uma prática antiga do Incra: colocar famílias contra famílias, provocar enfrentamentos entre elas. Em julho de 2012 os camponeses fizeram uma assembleia e a maioria rejeitou a proposta do Incra de esperarem a negociação acampados numa área de 200 hectares oferecida por Timiro. Mesmo sabendo da negativa das famílias, numa reunião dias depois em Porto Velho, o Ouvidor Nacional dos latifundiários Gercino José forçou um acordo, que foi aceito por parte dos acampados, contra a decisão da maioria.
5. Ouvidores dos Latifundiários Márcia do Nascimento (em pé) e Gercino José (de terno) em reunião em Porto Velho, abril de 2013Ouvidores dos Latifundiários Márcia do Nascimento (em pé) e Gercino José (de terno) em reunião em Porto Velho, abril de 2013A Ouvidoria dos latifundiários acompanhou o despejo de setembro de 2012 e não fez nada para garantir o direito dos camponeses retirar todas suas ferramentas, materiais, criações e produção. Como sempre, a Ouvidoria dos latifundiários também não fez nada contra o fato de Timiro manter pistoleiros na área.
6. A polícia despejou os camponeses 8 vezes, sempre destruindo suas casas, roças e criações. Chegaram a atirar bala de borracha em mulheres grávidas e crianças. Um senhor acabou falecendo, porque a polícia não permitiu que seu filho fosse à cidade buscar o remédio que ele tinha que tomar; quando ele foi socorrido, já era tarde. O camponês Orlando Pereira Sales, conhecido como Paraíba e outro camponês foram assassinados. A esposa do Paraíba também sofreu um grave atentado. Como sempre, nada foi feito.
7. No dia 21 de novembro de 2012, dois camponeses da área presenciaram uma boiada de Timiro transitando na BR-429 sendo escoltada por uma viatura da PM. Os camponeses tentaram fotografar, mas os policiais agrediram um deles com coronhadas, tomaram a máquina fotográfica e apagaram as fotos.
8. A Promotora de São Miguel não permitiu a prefeitura arrumar a estrada para que o escolar pudesse entrar na área e transportar as crianças para a escola. Quando chove, a estrada fica péssima, até de moto é difícil transitar. Algumas crianças chegam a andar até 12 Km para pegar o escolar. Duas vezes uma criança desmaiou na estrada.
Verduras produzidas pelos camponeses na área Paulo Freire 3 são vendidas na feira de SeringueirasVerduras produzidas pelos camponeses na área Paulo Freire 3 são vendidas na feira de Seringueiras9. Juíza Jaqueline Amaral que em menos de 1 dia deu ordem de despejo, sem ler o processoJuíza Jaqueline Amaral que em menos de 1 dia deu ordem de despejo, sem ler o processoNo dia 25 de dezembro de 2012, a juíza federal substituta Jaqueline Conesuque Gurgel do Amaral deferiu a reintegração de posse menos de 1 dia depois de receber o pedido de Timiro. Ela admitiu que não teve acesso aos autos e baseou-se apenas em Boletim de Ocorrência e documentos trazidos por Timiro. A advogada dos camponeses sequer teve acesso a estes documentos.
10. A justiça federal determinou que quase 70% da fazenda deve ser retomado ao latifundiário e apenas 800 hectares deve ser entregue ao Incra para distribuir às 84 famílias camponesas.
11. Fábio da Fetagro trabalhou na área para convencer os camponeses a abandonarem seus lotes, ficarem acampados numa área alagada até o Incra negociar as terras. Os camponeses não aceitaram e Fábio disse aos camponeses, comerciantes e políticos de Seringueiras, que a LCP era uma organização criminosa. Os camponeses dizem: “Não pode ser bandido quem nos incentiva a trabalhar nas terras”
Onde existe opressão, existe resistência
Camponeses retomaram a fazenda e ficaram neste acampamento improvisado antes de retornarem à suas terrasCamponeses retomaram a fazenda e ficaram neste acampamento improvisado antes de retornarem à suas terrasOs camponeses cortaram por conta e distribuíram 84 lotes, plantaram roças e hortas, criaram animais, construíram casas, construíram a estrada com recursos próprios. Todos que visitavam a área Paulo Freire 3 voltavam com uma galinha, um cacho de banana ou um pé de mandioca.
Uma vez, as famílias prenderam um ônibus e uma combi escolares, das redes municipal e estadual de educação. Com este justo protesto conseguiram que o escolar entrasse na área, mesmo só no período da seca, pois a estrada nunca foi arrumada adequadamente, foi uma conquista importante da união e combatividade dos camponeses.
Mas as famílias sempre se reorganizaram, retomaram as terras e reiniciaram a produção, pois a necessidade é maior que a repressão, assim como e certeza da justiça da luta sagrada pela terra para quem nela trabalha. Assim como milhões de camponeses que lutam nos 4 cantos do Brasil, os bravos camponeses da área Paulo Freire 3 necessitam e contam com o apoio desinteressado de trabalhadores das cidades, pequenos e médios comerciantes, intelectuais honestos, entidades e pessoas democratas.
O povo quer terra, não repressão!
Terra para quem nela vive e trabalha!
Conquistar a terra, destruir o latifúndio!

LCP – Liga dos Camponeses Pobres de Rondônia e Amazônia Ocidental

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