a nova democracia
Cercado pela CPI que investiga crime deliberado e tentando escapar dela, o presidente precisa atender ao centrão e apostará na radicalização. Para tanto, levanta “terrorismo da LCP” para fomentar um golpe aberto para salvar-se, preocupando os generais que querem estabilidade e temem um levante de massas. Foto: Jefferson Rudy
Desde o “triunfo” de Jair Bolsonaro nas eleições das mesas diretoras na Câmara e no Senado – nas quais apoiou os candidatos que acabaram eleitos presidentes –, afirmávamos tratar-se de mais uma Vitória de Pirro. Bolsonaro se tornou ali mais refém, enfraquecido; teria que ceder cada vez mais as verbas públicas e cargos comissionados ao insaciável “centrão” e, em troca, receberia apoio pontual e uma fatura ainda mais cara a pagar em troca da própria salvação.
CPI: fecha-se o cerco contra Bolsonaro
O capítulo seguinte é o que vemos. Abertura da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid-19 para investigar crimes do governo militar de fato na condução das políticas de saúde, coordenada por iniciativa do centrão, com o claro objetivo de chantagear Bolsonaro – disso não há dúvidas. Não por falta de crimes, mas precisamente porque as vossas excelências parlamentares são tão preocupadas com os interesses das massas como o próprio Bolsonaro. Seus interesses, corporativos, consistem em obrigar Bolsonaro, o Fraco, a ceder tudo quanto tenha em verbas.
Os bolsonaristas intentaram esvaziar a CPI lançando-a sobre governadores e prefeitos, coisa impossível por sobrepassar os limites federativos. Buscaram com isso muito mais propagandear a ideia de que os governadores são os verdadeiros culpados na pandemia – pela corrupção sinistra que assaltou os recursos destinados – e a CPI, uma perseguição política. Por outro lado, as ratazanas do Senado afirmam que o culpado é o Governo Federal, por sua negligência, e que seus interesses são tão somente o bem público. É como diz o ditado: na politicagem reacionária, todos dizem a verdade quando acusam seus opositores e mentem quando defendem a si mesmos.
Os fatos e as forças
Trata-se do desenvolvimento, já há muito analisado, de que a extrema-direita bolsonarista tenderia à desmoralização e ao isolamento, após um longo trabalho de desgaste conduzido pelo núcleo do establishment (a direita militar hegemônica no Alto Comando das Forças Armadas – ACFA, principais monopólios dos meios de comunicação e os círculos mais poderosos das classes dominantes). Diante disso, para sustentar-se no cargo como última chance de vingar seu projeto de poder e de salvação pessoal, Bolsonaro se tornaria ainda mais refém da centro-direita ávida por recursos, na espera de algum fato externo lhe favorecer para “virar a mesa” entre os altos mandos militares e emplacar seu golpe fascista.
A análise se comprovou, novamente. Luís Roberto Barroso, ardoroso defensor da “Lava Jato” – alinhado, portanto, com o plano de golpe de Estado gradual e pelas vias institucionais desatado pelo ACFA –, porém entrincheirado no espírito corporativo em defesa do Supremo Tribunal Federal (STF), foi quem determinou a abertura da CPI diante do imbróglio que se tornara a discussão sobre a legalidade ou não do procedimento. A Rede Globo, a sobressaltos ante a possibilidade do golpe bolsonarista, propagandeia o apaziguamento com a ofensiva contrarrevolucionária do ACFA, que por sua vez busca apaziguar o golpismo de Bolsonaro. Com seus noticiários, dia sim, outro também, dá todas as informações possíveis sobre os pronunciamentos na CPI, com as devidas “observações editoriais” sobre as contradições em termos dos que amenizam a culpa de Bolsonaro.
A extrema-direita bolsonarista, em especial seu projeto de chefe que ocupa a presidência, aposta na radicalização diante da difícil tarefa de abortar a CPI. Sabe ele que a abertura de um processo de impeachment, subsequente à CPI, se esta apontar crimes de responsabilidade ou outros, tende a unificá-lo com toda a opinião pública reacionária que apoia a ofensiva contrarrevolucionária desatada pelos generais, inclusive na caserna, condição extraordinária para que Bolsonaro obrigue os generais a comporem com ele alegando “intromissão nos Poderes constituídos”, “caos social” e necessidade de intervenção militar completa para “restabelecer a ordem” e “fazer cumprir a Constituição”. Para tanto é que tem pregado sobre o “terrorismo no campo”, a existência de “narcoguerrilhas” nas metrópoles e, também por isso tem instigado o agravamento da pandemia. E, claro, como quem “acende vela para dois santos”, tratou-se de se precaver e cedeu, através de manobras orçamentárias, mais de R$ 3 bilhões para comprar apoio na CPI ou até desidratá-la.
Pois vejamos. Veio a público através dos monopólios de imprensa, após o início dos trabalhos da CPI, que o ventríloquo fascista, Carlos Bolsonaro, soprou ao ouvido do pai que se deve “radicalizar” como única condição para sobreviver. Ato contínuo, um Bolsonaro histriônico acusou a China de “guerra bacteriológica” – justamente o país do qual ele depende para produzir as vacinas, condição para controlar a pandemia e estabilizar o país. Claramente, o presidente não quer estabilizar nada; sabe que a única salvação é justamente o oposto, aprofundar o caos social para justificar impor seu reino de terror fascista. Atrás dele vão as hordas de vivandeiras de quartel – isso que de pior produziu o esgoto da velha sociedade burocrático-latifundiária brasileira – lotadas no Clube Militar, maçonaria e outros covis e lupanares.
A direita militar vê o grande perigo disso. Antes da abertura da CPI, o ministro da Defesa, Walter Braga Netto, em cerimônia, afirmou que era preciso o país estar “unido contra qualquer tipo de iniciativa de desestabilização institucional que altere o equilíbrio entre os Poderes” – percebe-se: aqui ele bate, simultaneamente, em Bolsonaro e no “centrão”. E continua: “O momento requer esforço de união nacional com foco no combate à pandemia e apoio à vacinação. Enganam-se aqueles que acreditam que estamos sobre um terreno fértil para iniciativas que possam colocar em risco a liberdade conquistada por nossa nação”.
Sabem os golpistas do ACFA que tudo que eles não podem permitir se resume no agravamento da crise geral da velha sociedade, da sua base econômica às instituições e toda a superestrutura. Bolsonaro advoga por isso: trata-se mesmo da sua salvação. A centro-direita acaba por contribuir com tal agravamento quando, fisiológica, busca resistir em defesa de seus interesses corporativos em detrimento dos interesses da velha ordem como um todo. Os generais buscam debelar a crise geral com o mínimo de perigos para a contrarrevolução, para o que exige impor linha e direção únicas garantidas somente por um golpe. Tudo para extirpar, antes que seja tarde, a instabilidade e a crise ímpares que convocam as massas e as encorajam a romper a letargia e combater por seus interesses imediatos e, depois, por seus interesses histórico-universais.
A situação marcha mesmo para desbordes extraordinários, nunca vistos na história do país. E, no fim das contas, tudo depende das crescentes e contundentes ações das massas populares mais profundas, clamadas pelas necessidades históricas. Delas é exigida, como disse Lenin citando Danton: “audácia, audácia, audácia!”.
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