Monday, December 1, 2014

from Portugal - A questão da luta armada no movimento operário - for debate

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A questão da luta armada no movimento operário

 
 
[Nota: el siguiente es un documento de reflexión y debate que nos ha remitido un camarada portugués. En él se aborda "La cuestión de la lucha armada en el movimiento obrero". El documento está en portugués pero es fácil de entender o en caso necesario los que lo deseen pueden recurrir a herramientas de traducción on line. ]
 

Três artigos de referência para abrir o tema: dois de Lénine e um de Estaline. As citações não substituem a leitura integral dos textos.
 
"A insurreição é espontânea, dizem eles. É impossível organizá-la e prepará-la, todos os planos de ação são utópicos (...) E desta forma, eles dizem: nós devemos cingir-nos às tarefas de propaganda e agitação a favor da insurreição, a favor do armamento das massas; nós devemos cingir-nos à "liderança política"; e quanto à liderança "técnica" do povo insurrecto, deixaremos as ações para quem as pratica"
(...)
 
"São a liderança técnica e a organização do levantamento em toda a Rússia que constituem as novas tarefas com as quais o proletariado está confrontado. E se o nosso partido quer liderar politicamente a classe operária, não pode recusar estas novas tarefas."
 
"Não são as ações de guerrilha que desorganizam o movimento, mas sim a incapacidade de um partido em colocá-las sob a sua alçada.
(...)
 
Em qualquer guerra, uma ação militar desorganiza sempre as fileiras em certa medida. Contudo, isto não significa que não devamos lutar. Significa apenas que temos de aprender a lutar. Eis tudo"
 
"A vitória do socialismo num país. por si só, não elimina todas as guerras. Pelo contrário, ela pressupõe a existência de guerras. O desenvolvimento do capitalismo acontece de forma desigual em diferentes países. Não pode ser de outra forma na produção de mercadorias. É assim irrefutável que o socialismo não pode alcançar a vitória simultaneamente em todos os países. O socialismo chegará à vitória num ou vários países, enquanto outros permanecerão numa fase de domínio burguês ou pré-burguês. Esta situação criará não apenas fricção, mas tentativas diretas das outras burguesias em esmagar o proletariado vitorioso dos estados socialistas. Nesses casos, uma guerra da nossa parte seria legítima e justa. Seria uma guerra pelo socialismo, uma guerra para libertar as outras outras nações da burguesia.
(...)

Os pastores da caridade e os oportunistas estão sempre prontos a alimentar sonhos de um socialismo pacífico. Mas aquilo que realmente os distingue dos social-democratas revolucionários é que estes recusam pensar nas lutas de classes e guerras de classes necessárias a esse fim.
(...)
 
Uma classe oprimida que não se esforce por aprender a usar armas, a adquirir armas, merecer ser tratada como escravos. A menos que sejamos pacifistas aburguesados ou oportunistas, não podemos esquecer que vivemos numa sociedade de classes, e que desta não podemos sair sem luta de classes. Em todas as sociedades de classes, sejam estas baseadas na escravidão, na servidão ou no salariato, a classe opressora está sempre armada."

Nos três textos defende-se a necessidade de preparar esta forma de luta, para ser usada tanto ofensiva como defensivamente.
 
No artigo de Lénine sobre a guerra de guerrilhas, trespassa a sua irritação com os trejeitos escapistas e os desqualificativos como "blanquismo, anarquismo e terrorismo" - fenómenos reais, mas que não são sinónimo de luta armada, e poderão ser instrumentais ao oportunismo e ao reformismo, porquanto Lénine foi ele próprio acusado de "blanquismo" por Rosa Luxemburgo e Eduard Bernstein.
Então qual é a diferença?
 
Voltarei ao tema num outro post, mas para já adianto que Lénine define com precisão o que entende por guerrilha: eliminação física dos inimigos e expropriação de fundos para a ativiade política. Portanto, não é esta a diferença do blaquismo, do anarquismo e do terrorismo, para outros processos de luta insurrecional. A diferença é que a luta armada de guerrilha é uma das fases na escalada das contradições, que neste caso Lénine coloca a seguir às "greves dos trabalhadores (1896-1900), às manifestações de trabalhadores e estudates (1901-02), às revoltas dos camponeses (1902)" e depois ao início das greves políticas já articuladas com manifestações e confrontos de baixa intensidade. A guerra de guerrilhas insere-se nessa escalada que vai desembocar no levantamento de dezembro de 1905. Prever uma escalada das contradições pela simples injeção de violência organizada, que não segue as dinâmicas sociais, é negar o papel das contradições internas. Acresce que Blanqui podia ao seu tempo, dedicar-se apenas à ação revolucionária e conspirativa argumentando que o nível de repressão impedia que as atividades de agitação e propaganda pudessem sequer ser feitas.
 
No 'programa militar da revolução proletária' Lénine expõe com clareza quais os obstáculos que as propostas de "desarmamento" das populações criam à revolução. Argumenta que o desarmamento não responde à questão da revolução - foge dela. Não há revolução sem armas. Lénine opõe-se também à participação em exércitos da burguesia. Contra o exército da burguesia, defende o exército do proletariado. O nosso exército de classe.
 
É importante notar que encontramos, nos dias de hoje, unidade entre diferentes posições reformistas e destas com os liberais, em oposição a esta linha justa. A defesa do desarmamento, por mero exemplo nos EUA onde ainda existe um dispositivo constitucional que protege o direito a possuir armas, parte de posições distintas. Vemos essas mesmas posições distintas chegarem à mesma conclusão no debate sobre o Serviço Militar Obrigatório. Este foi um debate confuso e cheio de miasmas, onde vimos esquerdistas defender uma posição justa, sem assumir a sua consequência lógica. Ou seja, esquerdistas que se opõem ao reforço do exército burguês não porque queiram ser eles a treinar a classe operária na arte da guerra, mas exatamente porque não querem exército nenhum, nem da burguesia, nem do proletariado. Defendem uma posição justa, pelas razões erradas, ou seja, apenas por puro oportunismo pacifista. Por outro lado vemos posições que estão erradas, mas que procuram responder à questão revolucionária, ou seja, a defesa do Serviço Militar Obrigatório para que seja o estado burguês a treinar a classe operária no uso das armas, uma vez que esta não dispõe de ferramentas no imediato para fazer essa aprendizagem. Este não é um debate lateral, é bastante importante para analisar corretamente a questão da luta armada.
 
Voltemos ao início. Essa necessidade de canalizar a revolta popular leva o POSDR, no seu III Congresso, a assumir o papel de vanguarda do levantamento armado - como aqui explica Lénine no relatório ao Congresso. Em abril de 1907, no V Congresso do POSDR em Londres, não se confirma a decisão do III Congresso. Mais, rejeita-se explicitamente a sua aplicação prática. As posições de Lénine e Martov colidem, com o segundo a ganhar a contenda com 65% dos votos.
 
Lénine não vai respeitar a decisão do V Congresso. Juntamente com Estaline e outros camaradas, vão planear e executar o roubo de 341 000 rublos em 1907 em Tblissi.
 
Em aplicação das decisões do III Congresso, Estaline vai criar logo um laboratório para o fabrico de explosivos. Na noite de 12 para 13 de abril de 1906, um comando de seis bolcheviques disfarçados com uniformes do regimento de infantaria, vai expropriar 315 mil rublos do tesouro público também em Tblissi. Estaline é uma figura central durante este processo.Ficará também famoso pelas suas acções militares Semeno Petrossian, mais conhecido como Kamo.
 
Podemos apenas concluir até aqui o seguinte: a luta armada e a guerra assimétrica fizeram-se no passado, fazem parte da história do movimento operário, e corresponderam a momentos de luta que antecederam revoluções. A Revolução de Outubro é apenas um exemplo.
 
Podemos concluir também que até aqui, a história continua a convalidar a tese de Lénine: não existem caminhos pacíficos para o socialismo. Não sabemos se aparecerá no futuro uma experiência ou várias, que ponham em causa a tese, mas aqueles que se dizem do socialismo científico constroem a teoria revolucionária com base na evidência histórica concreta. Não com base em especulações.
E isto é o princípio da discussão.
 
A dialéctica contra o mecanicismo dos dois tempos
 
Convém reconhecer em primeiro lugar que não estamos em 1906 em guerra aberta com o czarismo. Hoje temos sufrágio universal, direitos sindicais, de manifestação e organização. Quando pergunto se nos dias de hoje devemos realizar tarefas tais como preparação militar, guerra assimétrica ou de baixa intensidade, descontando as caricaturas, costumo receber respostas como "não estamos nessa fase" e "primeiro necessitamos do apoio das massas" e a minha preferida "isso seria uma desculpa para reprimirem o movimento". Não costumo insistir. Noto apenas que a caricatura de Blanqui tem uma alma gémea, neste caso será o João Calvino - que inaugura o marxismo-calvinismo.
 
Acham eles que não têm que fazer rigorosamente nada, que não deve haver nenhuma prática revolucionária nem preparação de qualquer tipo, até que uma catástrofe reveladora apareça a sinalizar - "escutai camaradas, agora sim chegou a fase das revoluções". É a pretensão de saber se esta é ou não uma época de revoluções, sentadinhos no alpendre a olhar para a maçã à espera que ela caia de madura. Como se nós estivéssemos fora dessas contradições a observar apenas o que se passa. Como se entre o objectivo e o subjectivo não existisse uma relação dialéctica. Nós somos parte da equação.

Tudo isto se torna ainda mais grosseiro quando observamos que são esses mesmos fatalistas e calvinistas, aqueles que caricaturam e rejeitam todas as iniciativas que respondam a estas dinâmicas. Seja quando um colectivo de jovens ocupa uma casa, ou quando arremessam pedras à polícia. Caricaturar e condenar é o que fazem, enquanto esperam que um meteorito choque com a terra para que se dê início à nova fase.
 
É mais grave ainda dizer que a prática revolucionária justifica a repressão do outro lado, e que portanto a devemos abandonar. Parece-me que temos aqui ciência a mais e não a menos, porquanto isto só pode querer dizer uma de duas coisas: ou que não querem lutar para evitar a repressão; ou então que se descobriu uma fórmula de lutar sem sofrer a repressão do outro lado. Se estamos perante o segundo caso, por favor revelem ao mundo o vosso descafeinado. Queremos todos aprender, mas até lá, e julgando a história das últimas décadas, creio que não levarão a mal o meu cepticismo.
 
Parece-me óbvio que acreditar na hipótese da revolução nos dias de hoje e aqui na Europa, é algo que não se afirma apenas, pratica-se. Parece-me óbvio também que nós não sabemos quando é que se vai fechar o triângulo do fogo, e portanto temos que, não apenas acompanhar as dinâmicas sociais, mas também tentar em cada momento elevar o nível da conflitualidade e preparar-nos para enfrentar o outro lado da barricada. E depois na prática sim, veremos se a "relação de forças" permite introduzir maior conflitualidade, ou se somos forçados a recuar de forma organizada. Na prática concreta, não da boca de uma luminária que julga antever as dinâmicas sociais sem prática, e muitas vezes sem teoria nem prática.
 
Nós não temos apenas a evidência histórica da inexistência de caminhos pacíficos para o socialismo. É óbvia também a impossibilidade geográfica e militar de empreender na Europa formas de luta armada como as guerras populares que se praticam neste momento nas Filipinas e na Índia, ou que se praticaram no passado no Peru e no Nepal; ou ainda as formas que a guerrilha assume na Colômbia ou no Paraguai. Temos portanto que analisar as formas que as expressões armadas poderão assumir na Europa. No passado recente essas experiências foram de organizações como os GRAPO, FRAP, FP-25, ETA, IRA, Brigadas Vermelhas, Fracção do Exército Vermelho, FNLC, etc.
 
Independentemente da nossa concordância ou discordância com a linha política de algumas destas organizações, foram elas que fizeram na prática a guerra contra o estado. São elas que têm o conhecimento acumulado, e é estudando a sua história e as suas ações que poderemos melhorar a nossa prática e construir organizações que aguentem os golpes repressivos, ao mesmo tempo que ganham o apoio das massas e consigam ter a solidez teórica para sobreviver à degenerescência.
 
Conseguir juntar estes ingredientes não é fácil, o mais fácil é simplesmente ignorar esta discussão e caricaturar quem a faz. Os comunista vão ouvir novamente os epítetos parecidos aos que Lénine ouviu: blanquista, anarquista, terrorista. É normal. Faz parte do processo. Mas no final os comunistas e o movimento operário sairão com uma síntese desse debate, que voltará a oferecer à classe operária os instrumentos de que necessita para vencer.
 
Zé do Telhado.
 

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